26 junho, 2011

Como é que se Esquece Alguém que se Ama?

Como é que se Esquece Alguém que se Ama?

 Como é que se esquece alguém que se ama? Como é que se esquece alguém que nos faz falta e que nos custa mais lembrar que viver? Quando alguém se vai embora de repente como é que se faz para ficar? Quando alguém morre, quando alguém se separa - como é que se faz quando a pessoa de quem se precisa já lá não está?



As pessoas têm de morrer; os amores de acabar. As pessoas têm de partir, os sítios têm de ficar longe uns dos outros, os tempos têm de mudar Sim, mas como se faz? Como se esquece? Devagar. É preciso esquecer devagar. Se uma pessoa tenta esquecer-se de repente, a outra pode ficar-lhe para sempre. Podem pôr-se processos e acções de despejo a quem se tem no coração, fazer os maiores escarcéus, entrar nas maiores peixeiradas, mas não se podem despejar de repente. Elas não saem de lá. Estúpidas! É preciso aguentar. Já ninguém está para isso, mas é preciso aguentar. A primeira parte de qualquer cura é aceitar-se que se está doente. É preciso paciência. O pior é que vivemos tempos imediatos em que já ninguém aguenta nada. Ninguém aguenta a dor. De cabeça ou do coração. Ninguém aguenta estar triste. Ninguém aguenta estar sozinho. Tomam-se conselhos e comprimidos. Procuram-se escapes e alternativas. Mas a tristeza só há-de passar entristecendo-se. Não se pode esquecer alguem antes de terminar de lembrá-lo. Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e desonra-o na alma. A saudade é uma dor que pode passar depois de devidamente doída, devidamente honrada. É uma dor que é preciso aceitar, primeiro, aceitar.


É preciso aceitar esta mágoa esta moinha, que nos despedaça o coração e que nos mói mesmo e que nos dá cabo do juízo. É preciso aceitar o amor e a morte, a separação e a tristeza, a falta de lógica, a falta de justiça, a falta de solução. Quantos problemas do mundo seriam menos pesados se tivessem apenas o peso que têm em si , isto é, se os livrássemos da carga que lhes damos, aceitando que não têm solução.


Não adianta fugir com o rabo à seringa. Muitas vezes nem há seringa. Nem injecção. Nem remédio. Nem conhecimento certo da doença de que se padece. Muitas vezes só existe a agulha.


Dizem-nos, para esquecer, para ocupar a cabeça, para trabalhar mais, para distrair a vista, para nos divertirmos mais, mas quanto mais conseguimos fugir, mais temos mais tarde de enfrentar. Fica tudo à nossa espera. Acumula-se-nos tudo na alma, fica tudo desarrumado.


O esquecimento não tem arte. Os momentos de esquecimento, conseguidos com grande custo, com comprimidos e amigos e livros e copos, pagam-se depois em condoídas lembranças a dobrar. Para esquecer é preciso deixar correr o coração, de lembrança em lembrança, na esperança de ele se cansar.






Miguel Esteves Cardoso, in 'Último Volume'

Não se esquece, mas o tempo faz com que seja suportável a dor.
Esta é a minha esperança!
Já me separei e divorciei e nada é semelhante ao que sinto agora, depois do Rainer morrer.
Nunca o vou esquecer, nunca vou deixar de sentir o que sinto, mas tenho quase a certeza que o tempo me vai ajudar. O MEC tem razão.

5 comentários:

  1. O MEC tem razão...
    Ia a escrever "bom seria que não tivesse" e que os seres amados não fossem depois mais que doces presenças espalhadas na rotina dos dias. Mas se amar é se dar e se alguèm que amamos parte, vai com ela, também, uma nossa parte. Tal não significa que a força nos falte e por vezes até se redobre...

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  2. Olá Rogério!

    Estou inteiramente de acordo consigo. Não faltará a força e até se redobrará porque a vida ainda espera muito da Susana. Ela tem muito para dar a todos nós.

    abraço

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  3. Rogério, obrigada pelo seu comentário. Não acredito que redobre as forças mas vou continuar viva.

    Luísa, obrigada pela confiança.

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  4. Susana, este texto de Miguel Esteves Cardoso descreve na perfeição o que vai no coração de quem perde o grande amor da nossa vida... Até parecia que eras tu ou eu a escrevê-lo! Tens de arranjar força e coragem para ultrapassar essa dor. E é como dizes: O luto tem de ser feito porque "Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e desonra-o na alma".
    Abraço
    Ana Sá

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  5. Não se esquece ninguém que se ama e partiu...recorda-se com muita muita saudade!
    Beijinhos amiga
    Ana Neves

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